É muito bonito podermos lutar pelos nossos direitos, protestarmos quando achamos que algo não está bem, fazermos valer os nossos ideais e valores. Mas lá por vivermos em democracia e liberdade (nós portugueses pelo menos podemos gabar-nos disso) não quer dizer que possamos passar por cima de tudo e de todos. Já diz o ditado que “as regras foram feitas para serem quebradas”, mas existem certas regras que deveriam ser intocáveis. Como a do respeito pelo próximo.
A cidade de Marselha acordou, ontem, novamente em sobressalto com o ataque a um autocarro, perpetrado por jovens franceses de origem estrangeira. Este incidente surge um ano após os graves confrontos, denominados de “revolta dos subúrbios”, que resultou na destruição de 294 edifícios e milhares de veículos. Há um ano atrás estes ataques desenfreados atingiram apenas edifícios e automóveis, mas o incidente de sábado quase vitimou uma jovem, de origem senegalesa, que não teve tempo de fugir do autocarro em chamas. Estes ataques estão a ser levados a cabo por jovens, que já tendo nascido em solo francês, têm origem estrangeira, e dizem-se vítimas de discriminação. Então, resolveram despejar toda a sua raiva, não em protestos contra o governo, que será o responsável pela elevada taxa de desemprego (a qual apregoam aos quatro ventos), mas sim contra pessoas. Neste caso, uma jovem (que se encontra entre a vida e a morte), uma ‘irmã’, poderia dizer-se, já que também é uma francesa de origem estrangeira.
Para mim, a discriminação é uma questão ambígua, uma faca de dois gumes, que fere mais os alegados discriminadores que os discriminados. Apenas porque, muitas das vezes, a discriminação parte destes últimos. É-o em França, com a evidente busca de protagonismo destes jovens, e é-o em qualquer outra parte do mundo onde haja preconceito seja ele racial ou de qualquer outro tipo. Preconceito muitas vezes preconizado por aqueles que se dizem discriminados.
Agora, o que não podemos fazer é disparar em todos os sentidos, e ficar à espera que os problemas se resolvam somente através da força. Infelizmente, ainda há muito boa gente que pensa assim.